segunda-feira, 7 de junho de 2010

Vida de Libélula - parte 1



Certa vez recebi um convite inuzitado...
Sempre que chego em casa depois de um dia inteiro fora, gosto de me sentar no vaso sanitário do meu banheiro e refletir um pouco, pensar sobre como foi o dia. É um tipo incomum de meditação mas que muita gente faz sem perceber. Nesse dia me veio à cabeça que precisava mudar. Mudar de ambiente, o estilo de vida, variar atividades, radicalizar. Escorei minha cabeça na caixa d´agua do vaso e fechei o olho tentando encontrar uma forma de dar um novo sentido pra minha vida, que não era ruim mas estava meio parada, desanimada, meio cansativa. Desliguei a luz por um momento, o banheiro teria escurecido se não fosse pela luz vinda de uma lâmpada do lado de fora do banheiro que entrava pela janela e era cortada devido as persianas, o efeito era uma penumbra agradável à vista e traquilizante para a mente. Estava sem roupa, corpo relaxado, mente esvaziando-se...quando ouço um zumbido elétrico vindo da janela. Assustei-me à primeira vista mas logo conclui que era apenas um besouro a procura de sair dali e sem obter muito sucesso, voltei a meditar e não demorou muito para tomar outro susto com o zumbido macabro daquele inseto quebrando a corrente de meus pensamentos. Levantei-me sem acender a luz e tentei enchergar o besouro atravéz das persianas, da tela quadriculada que protegia contra a entrada mosquitos e da poeira que acumulara-se sob a tela com o passar do tempo e que contra a luz vinda de fora tornava-se nitidamente visível. Não encherguei o bicho mas pelo bater de asas que lembrava um gerador de tensão, imaginei ser uma libélula, que era comum naquela região devido à lagoa residente no bairro. Um fato curioso sobre as libélulas é que quem tiver dúvidas quanto à qualidade da água de um rio ou lago pode fazer o "teste da libélula", que consiste na simples observação se há libélulas na área. Todo rio ou lago com águas limpas tem libélula. No entanto, a menor alteração físico-química da água ou do ar já será suficiente para expulsá-las, além de impedir que dos ovos saiam novas larvas. Alguém me disse isso quando era pequeno e desde então sempre confiro se há libélulas por perto dos reservatórios de água natural onde me banho ou mergulho.Estando prestes a me sentar, eis que ouço novamente o zumbido. Fiquei intrigado com o que vi, não enchergava o bicho mas pude ler na poeira da tela a frase: Je veux changer. Não entendi o que aquilo significava até porque meu francês é mínimo e perguntei pensando alto "O que isso significa?" Outra vez o zumbido e uma nova frase se formou na poeira: Quelque chouse de noeveau. Intriguei-me mais ainda, estaria eu conversando com uma libélula? No limite de minha sanidade ousei perguntar "Você fala português?", sorri quando após o zumbido estava escrito: Pouco saber eu, trocar quero, algo novo tentar. Juntei as idéias muito rapidamente, ela ouvira meus pensamentos, meditava comigo e eu não sabia. "Devo ter batido com a cabeça no vaso e isso é um sonho", pensei, mas a verdade é que só em sonho eu teria uma chance daquela de troca de lugar com uma libélula, mudar de vida por um tempo, foi o que ela me propusera, só por um tempo e depois destrocaríamos. "Posez vos mains dans le miroir et faire un bruit de vibration avec sa bouche" disse ela e eu entendi perfeitamente, como se fosse institivo. Encostei minha mão no espelho ainda com a luz apagada, e naquela penumbra fechei meus olhos e zumbi com a boca, minutos depois estava fora do banheiro cercado de poeira e de dentro, olhos verdes brilhantes me encaravam felizes. Merci.
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